Economia & Negócios

Edição: Hugo Julião
12:34
24/10/2020

Diploma é essencial, mas há fortunas feitas no modelo mão na massa

O diploma universitário ainda é valorizado no mercado de trabalho, mas também é possível seguir uma carreira satisfatória sem ter passado pelos bancos da faculdade.

E engana-se quem pensa que estamos falando de empregos que exigem pouca qualificação. Nada disso.

O Estadão encontrou um CEO de um banco digital e um líder de branding em uma startup que abandonaram o curso superior por entenderem que a carreira estava mais promissora do que a jornada acadêmica.

Eles encontraram outras maneiras de se desenvolverem e adotam uma máxima comum à dos especialistas: estudar é sempre fundamental.

Um relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) publicado no começo de setembro apontou que 21% das pessoas entre 25 e 34 anos tinham diploma de ensino superior no Brasil em 2019.

Em comparação, essa realidade era de 45%, em média, nos países-membros da entidade.

No documento, o órgão destacou o impacto que o ensino superior pode ter na renda das pessoas: aquelas com o certificado ganhavam mais do que as que haviam concluído apenas o ensino médio.

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“Continua super válido. Acontece que o diploma antes era algo que poucos tinham e, por isso, era um grande diferencial.

Agora, ele virou um elemento básico para ter acesso ao mercado de trabalho, onde um set de conhecimentos é importante, até para trabalhar em ambientes que antes eram mais operacionais, como fábricas”, avalia Antonio Salvador, líder de negócios de career da Mercer Brasil, que oferece consultoria a empresas.

Ao mesmo tempo em que se tornou requisito básico, o diploma universitário deixou de ser determinista.

Dessa forma, é comum encontrar profissionais que atuam em uma área completamente distinta daquela em que se formou.

Na visão de Paulo Sardinha, presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH), a exigência e, consequentemente, a busca por um diploma universitário relacionam-se com o desemprego, que no Brasil é vivido por 13,7 milhões de pessoas.

“Quanto maior o desemprego, mais posso puxar a régua para cima, mas aí corre-se o risco de contratar alguém com qualificação muito alta para uma demanda que não é tudo isso e haver frustração.”

Para ele, de forma geral, a certificação “ainda constitui um valor fundamental e grande”.

No Brasil, a valorização de um curso superior se pauta também na busca por um status social melhor, com um emprego que supra as necessidades financeiras e promova bem-estar.

No exterior, é mais comum do que por aqui um profissional ter um salário satisfatório e ser feliz em uma profissão que não exige curso universitário.

“Isso acontece muito lá fora porque a estratificação entre o salário mais alto e o mais baixo é menor, há menos faixas e elas são mais próximas”, explica Sardinha, citando como exemplo Suécia e Noruega.

A distância entre o menor salário e o maior não é grande, então as pessoas aspiram de maneira mais comedida.

Além disso, principalmente na Europa, há a proteção do Estado, (a pessoa) não vai se preocupar com previdência.” 

​Os especialistas são unânimes em afirmar que, mais do que obter uma certificação de curso superior, estar dentro de uma faculdade possibilita outras experiências de vida que são valorizadas pelo mercado.

Iniciação científica, o desenvolvimento de habilidades interpessoais, a chance de fazer estágio ou trainee são algumas das portas que a universidade pode abrir.

Porém, mesmo que alguém opte por não seguir esse caminho, há diferentes possibilidades para se desenvolver pessoal e profissionalmente, com uma carreira bem sucedida.

A premissa é nunca parar de aprender.

Edisio Pereira começou a empreender aos 16 anos e virou CEO de um banco digital mesmo sem um diploma (Foto: Carlos Ezequiel Vannoni/Estadão)

"A disparidade salarial no Brasil é um problema e leva a um modelo de mercado cruel em que todos almejam chegar a um cargo muito elevado, sendo que não há vaga para todos.

Mas as pessoas estão enxergando novas formas de ser felizes, que é poder empreender”, afirma Mariana Torres, especialista em carreiras e recolocação

Um exemplo é Edisio Pereira Neto, que aos 16 anos fundou uma empresa de câmbio.

Poucos anos depois, ele iniciaria a faculdade de Administração, um caminho natural até mesmo pela profissão do pai.

Mas sabia que, pessoalmente, a melhor escolha era interromper os estudos. Hoje, aos 32 anos, ele é CEO do banco digital Zro Bank.

“Faltando dois períodos, eu estava num ritmo de trabalho intenso e tinha mais responsabilidade com a minha família, pois meu pai havia desacelerado. Percebi que o trabalho estava abrindo muito mais portas do que a faculdade”, diz Pereira Neto. 

Apesar de considerar o diploma importante para quem quer construir uma carreira como executivo, ele avalia que “a faculdade é um período muito longo na vida do braisleiro”, que teoricamente precisa ser cumprido antes de ir para o mercado de trabalho, além de “tratar as coisas de forma muito superficial”.

Com orgulho da trajetória profissional, ele conta que conseguiu montar um banco sem ser especialista em tecnologia ou mercado financeiro, mas dedicando-se a dezenas, talvez centenas, de cursos voltados às áreas de interesse.

Oratória, matemática financeira, análise de dados e mercado internacional são apenas alguns exemplos.

Ao vislumbrar uma boa oportunidade no passado, ele priorizou a expansão da empresa, que mais tarde foi vendida para um grande grupo de câmbio.

“Tudo isso aconteceu porque consegui focar 100% no negócio. Se tivesse dividido a atenção com a faculdade, poderia ou não ter acontecido, ou demorado muito mais”, afirma o executivo.

Iago Araújo trocou engenharia civil pela carreira no design gráfico (Foto: Sanar/Divulgação)

Pensamento semelhante teve Iago Araújo, de 27 anos, que atualmente é líder de branding na Sanar, startup brasileira na área de educação médica.

Filho de pai engenheiro e mãe professora, ele iniciou o curso de Engenharia Civil em 2016 sem grande vontade, mais interessado no ambiente onde estava inserido.

E o jovem logo percebeu que a faculdade não era para ele.

“Não encontrei nenhum curso que, aos meus olhos, era ideal, e a metodologia de ensino funciona muito pouco para o jeito como eu aprendo”, relata ao lembrar que se sentia “desconectado”.

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Em meio à controvérsia acadêmica, ele descobriu o design gráfico. 

Depois de se juntar com alguns amigos que tinham em comum a torcida por um time de futebol para criar um perfil do clube do Twitter e um blog, Iago ficou responsável pela parte gráfica e de redação. 

Sem conhecimento teórico nem prático, ele investiu em aprender. 

“O que funcionou muito para mim foi consumir tutorial, artigo, buscar pessoas que eram referência na área e no setor específico de esporte.

Acabei descobrindo a melhor forma como eu aprendo, que é metendo a mão na massa e assistindo vídeo com velocidade duas vezes aumentada.”

Livros e toda a gama de conhecimento que se pode encontrar na internet ajudaram a formar o profissional que ele é hoje.

Com informações do Estadão Conteúdo

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