Quatro médicos cubanos que atuaram no programa Mais Médicos conseguiram na Justiça dos Estados Unidos o direito de processar a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas).
Eles acusam a organização de participação em um suposto esquema de trabalhos análogos à escravidão no Brasil.
O Tribunal de Apelações do Distrito de Colúmbia decidiu, em 29 de março, que a filial da OMS para as Américas perdeu sua imunidade como entidade estrangeira caso tenha realmente se envolvido em atividades comerciais de intermediação financeira de um esquema de trabalho forçado no Brasil.
Médicos cubanos retornando para Havana, após a vitória de Bolsonaro na eleição de 2018 // Foto: Valter Campanato/Agência Brasil
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Os médicos cubanos Ramona Matos Rodriguez, Tatiana Carballo Gomez, Fidel Cruz Hernandez e Russela Margarita Rivero Sarabia, que moram atualmente nos EUA, moveram uma ação coletiva em 2018, em Miami, contra a Opas e seus diretores.
O Brasil não aparece como réu no processo, que foi transferido posteriormente para o Distrito de Colúmbia.
A acusação é de que a Opas receberia os pagamentos do governo brasileiro em uma conta bancária própria, nos Estados Unidos.
Do total recebido, a organização enviaria 85% para Cuba, embolsando 5% e repassando apenas 10% para os profissionais.
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Esse é o resultado de um levantamento realizado pela US News & World Report e colocou o Brasil em destaque no cenário internacional.
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Segundo os médicos, desde 2013, a Opas lucrou mais de US$ 75 milhões com o esquema e Cuba reteve mais de US$ 1,3 bilhão.
“A decisão é importante tanto como precedente legal quanto como uma oportunidade para os médicos, meus clientes que foram traficados para o Brasil pela Opas, terem a oportunidade de responsabilizar a Opas”.
A afirmação é do advogado Sam Dubbin, que representa os médicos cubanos, em depoimento reproduzido pelo jornal Miami Herald.
“O governo cubano nunca teria conseguido traficar meus clientes para o Brasil sem o papel central da Opas como intermediária financeira”, reforçou.
Já a médica Ramona Matos declarou ao jornal que o que se vivenciou no Brasil foi trabalho forçado – puro e simples.
"Em nome dos médicos cubanos que desertaram em todo o mundo, estamos entusiasmados com a decisão do tribunal. Este é um grande passo em direção a uma pequena forma de justiça”.
Médicas cubanos Ramona Matos, à esquerda, e Tatiana Caraballo // Getty Images
Em 2019, a médica Tatiana Carballo contou à BBC que chegou ao Brasil em 2014, depois de fazer um curso de 45 dias de português.
Ela afirmou que foi colocada em um avião pelo regime cubano, sem muitas informações sobre seu destino.
Em Limeira, interior de São Paulo, ela atendia de 25 a 30 pacientes por dia, e ganhava R$ 1,2 mil por mês, enquanto os colegas de outras nacionalidades recebiam R$ 11 mil.
"A escravidão moderna não é ficar amarrado e sendo chicoteado, é não poder ir e vir, não poder estar com seus filhos, não ser dono do seu próprio trabalho, nem do salário que deveria receber, não saber onde vai estar depois de amanhã, não poder decidir nada. É não poder escolher o próprio destino".
Segundo Tatiana, nesse sentido, ela era escrava sim, pois era impedida por autoridades cubanas de ficar mais de três meses com o filho de 13 anos.
Isso apesar de o governo brasileiro ter concedido visto de permanência para o adolescente à época.
"Pela primeira vez hoje, eu sou dona de cada passo que dou, desde que acordo, até a hora que vou dormir" defendeu Tatiana.
Na ação, os médicos pedem o ressarcimento por seus salários não pagos, além de danos morais.
O texto do processo afirma “que sua participação no Mais Médicos equivalia a trabalho forçado e tráfico humano”.
Segundo os profissionais, o governo cubano usava de expedientes como “pressão política e econômica, ameaças contra familiares e outras formas de intimidação” para recrutar pessoas.
Eles contam, ainda, que um “guardião” vigiava seus movimentos e que “sofreram assédio e intimidação por falar contra o Mais Médicos”.
A acusação também envolve uma orientação de “fazer campanha em favor dos partidos políticos brasileiros” apoiados por Cuba.
Em 2021, o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, lembrou que Cuba aparece há uma década no Relatório Anual sobre Tráfico de Pessoas, desenvolvido pelo departamento.
“Pelo 10º ano consecutivo, o relatório documenta como o governo cubano vem lucrando com missões médicas exploradoras no exterior.
O governo envia médicos e outros trabalhadores da área de saúde ao exterior, não os informa sobre os termos de seus contratos, confisca seus documentos e salários e faz ameaças a eles e seus familiares se tentam deixar a missão”, enumerou, em seu discurso de lançamento do documento, em julho do ano passado.
Com informações de Bruna Komarchesqui/GP