Na esteira da publicação do livro “La Familia Grande”, denunciando o incesto cometido por um famoso cientista político na França, o movimento contra o abuso ganha força e mobiliza milhares de pessoas na França.
Nesse final de semana, a hashtag #MeTooInceste foi compartilhada milhares de vezes nas redes sociais, revelando testemunhos que quebram o silêncio no país contra os culpados.
O livro de Camille Kouchner, La Familia grande, é um verdadeiro sucesso nas livrarias. Um fenômeno não necessariamente fácil de conviver para a autora que acusa seu padrasto Olivier Duhamel de incesto (Voici)
O livro “La Familia Grande”, escrito pela jurista Camille Kouchner, foi lançado em 7 de janeiro.
No texto, ela acusa o padrasto, Olivier Duhamel, de ter agredido sexualmente seu irmão gêmeo quando ele tinha apenas 14 anos, no final dos anos 1980.
Depois da publicação, a Procuradoria de Paris abriu uma investigação por "estupro e agressão sexual" contra o cientista político de 70 anos.
Ele participava com frequência de programas de TV e congressos e era professor da renomada escola Science Po de Paris.
Na resenha da imprensa francesa desta segunda-feira o movimento contra o incesto que ganha força. A primeira-dama Brigitte Macron abordou o tema e disse esperar uma reforma judiciária para lutar contra o incesto (© Adriana de Freitas/Fotomontagem RFI)
“A França tem um problema com o incesto”, afirma o jornal Le Monde ao noticiar a onda de publicações nas redes sociais francesas no fim de semana, acompanhadas da hashtag #MeTooIncesto.
O diário encontrou a psiquiatra Muriel Salmona, especialista em violência contra as mulheres e as crianças.
Ela consultou compulsivamente nos dois últimos dias os milhares de tuítes com testemunhos de franceses, conhecidos ou anônimos.
Eles revelam que foram agredidos quando tinham 5, 8 ou 13 anos, por um pai, avô, padrasto, irmão, tio ou primo.
"Esse movimento concretiza o que já sabíamos. Há muitas vítimas na França. O fato que elas comecem a falar é uma boa notícia. Isso significa que elas se sentem em segurança para enfrentar o peso do segredo", estima a psiquiatra.
O movimento, que pegou emprestado a hashtag #MeToo que sacudiu o mundo em 2017 contra os abusos sexuais, foi lançado pelo coletivo feminista francês “Nous Toutes” no sábado (16) ao meio-dia.
Trinta e seis horas depois, o Twitter estava abarrotado de mensagens de vítimas, mas também de mensagens de apoio.
"Eu tinha seis anos e tudo acabou em um porão"; "Cinco anos, meu tio"; "Toda a minha infância roubada por uma homem, meu pai"...
Nas mensagens, as vítimas falam do longo silêncio, que com frequência pesou sobre os fatos, e de suas consquências psicológicas terríveis.
O secretário de Estado para a Infância, Adrien Taquet, descreveu o incesto como “um crime sem cadáver” e antecipou o lançamento em breve de uma comissão sobre o tema.
Mas concreta e imediatamente, nada foi feito. Nem o presidente Emmanuel Macron, nem o primeiro-ministro Jean Castex, reagiram.
Por enquanto, a deputada Alexandra Louis, do partido A República em Marcha, no poder, apresentou um projeto para fortalecer a lei sobre o incesto, que tem o apoio da ministra da Cidadania, Marlène Schiappa.
O fenômeno que seria massivo na França atingiria uma em cada dez pessoas. “Profundamente tabu, ele é minimizado na sociedade”, aponta o jornal conservador.
Fonte: RFI