Vazamento de ofícios sigilosos dos serviços de inteligência americanos revelou, entre outros dados, que o Egito teria planejado enviar 40 mil foguetes à Rússia.
Entenda o caso e as consequências para a guerra na Ucrânia.
Há semanas circulam nas mídias sociais documentos secretos que teriam sido vazados dos serviços de inteligência dos Estados Unidos, a maioria deles sobre a guerra de agressão russa na Ucrânia.
A mídia americana vem relatando há dias sobre o vazamento, sem publicar os documentos propriamente ditos.
Uma das mais recentes revelações a partir desses dados se refere a uma tentativa de ajuda do Egito à Rússia.
De acordo com reportagem publicada na noite da segunda-feira (10/04) pelo jornal americano The Washington Post, documentos indicariam que o presidente egípcio, Abdelfatah al-Sisi – um dos mais importantes parceiros de Washington no Oriente Médio –, ordenou a produção de mais de 40 mil foguetes para enviar à Rússia.
Os documentos sigilosos publicados na plataforma social Discord mostram uma série de conversas entre Sisi e seus subordinados sobre a possível venda dos foguetes a Moscou.
Numa delas, datada de 17 de fevereiro passado, o presidente egípcio instrui um alto funcionário a ordenar a produção do material de forma secreta, visando "evitar problemas com o Ocidente".
No mesmo documento, o funcionário diz que ordenaria que seus funcionários trabalhassem duro para produzir as armas porque é "o mínimo que o Egito pode fazer para reembolsar a Rússia por sua ajuda no passado". Não é especificado, porém, a que tipo de auxílio se refere.
Uma fonte do governo dos EUA garantiu ao Washington Post que os EUA não estão cientes de que tal acordo entre a Rússia e o Egito se materializou. Por seu lado, a Embaixada do Egito nos Estados Unidos não confirmou ao jornal a veracidade do documento e limitou-se a garantir que o governo de Sisi tem posição de não intervenção em relação à guerra na Ucrânia.
Eis algumas das principais perguntas e respostas sobre o vazamento.
Dezenas de documentos militares e de inteligência altamente secretos dos EUA vazados revelam uma imagem detalhada da guerra na Ucrânia, assim como análises e informações confidenciais sobre a Rússia e outros países.
O vazamento tem implicações de longo alcance para os Estados Unidos e seus aliados.
Segundo a mídia dos EUA, eles incluem, entre outras coisas, informações sobre as entregas de armas à Ucrânia e sobre o gasto de munição. Há também mapas em que o curso da linha de frente da guerra é desenhado, incluindo localização das unidades militares russas e ucranianas e os tamanhos das tropas.
Alguns dos documentos assinalados como "secretos" foram produzidos em fevereiro e março passados, de acordo com o portal de notícias Politico.
Também há informações sobre os planos da Otan e dos EUA, assim como sobre a forma que os militares ucranianos devem ser preparados e armados para uma próxima grande ofensiva contra as tropas russas.
Além disso, os dados expõem, conforme veículos americanos, detalhes sobre quantidade e tipo das armas a serem fornecidas a Kiev, além das datas de entrega previstas.
Análises e informações sobre outros países, como China e Israel, também estão incluídas nos documentos, reportou o jornal The Washington Post.
Também pode ser visto neles com quais métodos os serviços secretos dos EUA coletaram as informações e quem são as fontes.
Os documentos aparentemente são originados de várias agências de inteligência dos EUA e até mesmo do Alto Comando das Forças Armadas dos EUA, informou o diário The Wall Street Journal. De acordo com a publicação, as informações parecem ser originadas de relatórios.
O especialista Aric Toler, do site de jornalismo investigativo Bellingcat, descobriu que os documentos foram divulgados na plataforma usada pela comunidade de jogadores de videogames Discord, os quais depois foram também disseminados pelos usuários russos dessa comunidade, por exemplo, no Telegram. Toler afirmou que eles podem ser genuínos, mas também apontou que alguns documentos foram claramente manipulados.
Autoridades americanas ouvidas pela agência de notícias Reuters disseram, por exemplo, que os documentos parecem ter sido alterados para reduzir o número de mortos entre os russos, de acordo com uma avaliação informal dessas fontes, independente da investigação oficial sobre o vazamento. Tal alteração reforçaria a possível participação de russos no vazamento.
A emissora americana CNN informou que funcionários do governo confirmaram a autenticidade dos documentos.
As autoridades dos EUA parecem levar o caso muito a sério. Tanto o Pentágono quanto o Departamento de Justiça estão investigando o ocorrido, segundo a mídia americana, que reporta também que o presidente dos EUA, Joe Biden, está "preocupado" com a quantidade de documentos tornados públicos, de acordo com um alto funcionário do governo citado sob condição de anonimato pelo portal Politico.
Muitos dos documentos não parecem ser falsificados e se assemelham em formato aos do serviço de inteligência estrangeira dos EUA, a CIA, afirmaram funcionários do governo ao Washington Post.
O diário The New York Times reportou que os documentos do Alto Comando das Forças Armadas parecem autênticos, conforme funcionários do governo.
Quem está por trás do vazamento?
Não está claro quem publicou os documentos. O indivíduo ou grupo responsável pelo vazamento é agora alvo de intensa investigação.
De acordo com a CNN, funcionários do governo afirmam que as apurações estão focadas, primeiramente, no interior dos próprios órgãos afetados.
Tais violações estão entre os crimes mais graves relacionados à segurança nacional dos EUA, de acordo com uma ex-advogada da Força Aérea dos EUA citada pelo Washington Post.
Os documentos podem afetar a Ucrânia e os Estados Unidos de múltiplas formas.
Embora já tenham sido produzidos há algumas semanas, eles ainda podem fornecer informações valiosas a Moscou, afirmou ao Washington Post o especialista Dmitri Alperovitch, diretor do think tank Silverado Policy Accelerator.
Mesmo que não contenham planos de batalha concretos, mostram, conforme o analista, o tipo e a quantidade de armas ocidentais que chegaram aos campos de batalha da Ucrânia, quantos soldados poderiam usá-las e como a Ucrânia planeja se defender dos ataques russos.
Além disso, os documentos deixariam claro o quanto os aparelhos de segurança da Rússia estão infiltrados pelos serviços secretos dos EUA, escreveu o New York Times, dando a Moscou informações sobre onde estão suas vulnerabilidades.
A CNN informou que os informantes dos EUA nos órgãos russos podem agora estar em perigo.
Como Ucrânia e Rússia reagiram?
O assessor presidencial ucraniano Mykhailo Podolyak disse que os documentos contêm "uma grande quantidade de informações fictícias" e se assemelham a "uma operação de desinformação russa para semear dúvidas sobre a contraofensiva planejada da Ucrânia".
Segundo ele, os próprios serviços secretos russos forjaram os documentos, com o objetivo de semear dúvidas e discórdia entre os aliados da Ucrânia e provocar distração das próximas etapas da guerra.
Nos bastidores, no entanto, há uma profunda irritação em Kiev por causa dos dados publicados, informou a CNN, citando círculos próximos ao presidente Volodimir Zelenski, que provavelmente também foi espionado.
Já a Rússia vê mais uma vez confirmado o envolvimento de Washington no conflito na Ucrânia.
O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, disse nesta segunda-feira que os "vazamentos são razoavelmente interessantes" e que estão sendo analisados por Moscou.
Na sexta-feira, ele declarou que a participação dos EUA e da Otan no conflito continua a crescer.
Mas a Rússia diz não esperar qualquer influência sobre seu desempenho na guerra – e conta com uma vitória.
Por outro lado, o think tank americano Instituto para Estudos da Guerra (ISW, na sigla em inglês) constatou medo e nervosismo entre blogueiros de guerra russos depois que os documentos foram publicados.
Como mostram os documentos, os serviços dos EUA também espionaram órgãos de seus próprios aliados. Isso pode gerar irritação entre os aliados.
O vazamento também levanta novas questões sobre quão seguras são as informações de inteligência que outros países encaminharam aos Estados Unidos, tendo em vista a ampla troca de informações secretas entre os países da chamada Aliança Cinco Olhos: EUA, Reino Unido, Austrália, Nova Zelândia e Canadá.
Com informações do G1