Tema Livre

Edição: Hugo Julião
11:56
07/04/2021

Artigo: "As bombas de Biden", por Hélio Beltrão

Joe Biden mal assumiu e já passou a manipular todos os botões disponíveis na sua poltrona de presidente dos EUA.

Não obstante o Fed ter pilotado um aumento de dinheiro em circulação de US$ 5 trilhões desde o início da pandemia, Biden aprovou novo auxílio emergencial maior que o PIB brasileiro: equivalente a R$ 10 trilhões, ante R$ 8 trilhões de toda a produção de bens e serviços brasileira em um ano.

Mas não parou por aí. Na semana passada, anunciou um plano de gastos para gerar empregos, melhorar a infraestrutura pública e combater o aquecimento global. São US$ 2 trilhões adicionais (R$ 11 trilhões), a serem gastos em oito anos, financiados por aumento de impostos sobre as empresas.

"Na segunda (5), Janet Yellen, sua poderosa (de Biden) secretária do Tesouro, propôs uma alíquota mínima mundial dos impostos sobre empresas. Nesta terça (6), o FMI e o governo alemão apoiaram a proposta. É um perigo." (Getty Images)

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Em perspectiva, se empilhássemos esses US$ 2 trilhões em notas de US$ 100, formaríamos uma torre que chegaria cinco vezes mais longe que a Estação Espacial Internacional em órbita.

Quando lhe foi perguntado se o aumento de impostos poderia afugentar empresas, investimentos e empregos do país, Biden considerou a tese “bizarra”.

Mas, na segunda (5), Janet Yellen, sua poderosa secretária do Tesouro, propôs uma alíquota mínima mundial dos impostos sobre empresas. Nesta terça (6), o FMI e o governo alemão apoiaram a proposta. É um perigo.

O propósito dessa iniciativa cartelizante é precisamente desincentivar que as empresas invistam e gerem empregos em outros países, como reação aos aumentos de impostos americanos. Se a tese fosse bizarra, Yellen não proporia a alíquota mundial.

O discurso de venda do aumento de impostos sobre empresas é populista: “Criação de empregos, financiados pelas empresas”. No entanto, são as empresas que criam emprego, não o governo; e o aumento de impostos as afugenta.

Mas é pior que isso. A empresa paga o Darf do imposto (incidência legal), porém é preciso entender de que bolso sairá o valor que a empresa usará para pagar o Darf (incidência econômica).

"O plano de gastos do Biden será financiado pelos trabalhadores" (Getty Images)

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Muitos creem erroneamente que os acionistas pagam a conta. Vários estudos, ao contrário, demonstram que a maior parte do Darf sai do bolso dos trabalhadores, da própria empresa e de seus fornecedores. Por outras palavras, o plano de gastos do Biden será financiado pelos trabalhadores.

Alguns argumentam que o investimento que o governo fará com esses impostos justifica tirar dos trabalhadores. É um equívoco. O trabalhador faria melhor uso do seu dinheiro.

O Congressional Budget Office demonstrou no relatório “The Macroeconomic and Budgetary Effects of Federal Investment” (2016) que o retorno dos investimentos do governo americano é apenas metade do retorno de investimentos privados. Ou seja, é queimar dinheiro.

Já o argumento de venda da alíquota mundial é que “não podemos permitir uma corrida ao fundo do poço”, uma competição entre os países, que pode diminuir a base de impostos do governo. Isso não ocorre.

Segundo o relatório “Paying Taxes 2020” da PricewaterhouseCoopers, não há tal corrida: os impostos sobre empresas (“TTCR”) estão estáveis há uma década.

A alíquota mínima pune os trabalhadores de países com boa gestão das contas públicas, que gostariam de cobrar impostos menores.

Mas e os programas assistencialistas? Os países nórdicos, com programas assistencialistas mais abrangentes, têm TTCR menor que a média da Europa, e cerca de metade da brasileira. Portanto, é o contrário: países com mais impostos têm programas piores, mais dívida, mais desemprego e menos crescimento.

Yellen e o FMI apreciam a competição entre empresas, mas rejeitam a competição entre governos. Estão instalando o botão de um novo arsenal nuclear-tributário, cujo acionamento pode ser devastador.

Os altos escalões dos países ricos decidem, e a população do mundo paga. Apenas o exercício da soberania dos países prejudicados pode conter essa manobra.

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Graduado em finanças com MBA pela Universidade de Columbia, Beltrão foi executivo do Banco Garantia, Mídia Investimentos e Sextante Investimentos, além de fundador e membro do conselho consultivo do Instituto Millenium e presidente do Instituto Mises Brasil.

É colunista do jornal Folha de São Paulo.

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