Na onda do home office forçado pela pandemia, companhias áreas, resorts e outras empresas ligadas ao setor de turismo têm se beneficiado de uma tendência que até já ganhou nome: o "anywhere office".
Com muitas empresas ainda em trabalho remoto, basta uma conexão à internet para que a paisagem da Avenida Faria Lima ou da Berrini, em São Paulo, seja trocada por uma da praia ou da montanha, até mesmo fora do país.
Com a vantagem extra de também poder deixar o confinamento em casa ou apartamento.
"Há famílias que conseguem flexibilizar o trabalho e podem passar dias em um resort, hotel ou cidade do interior", disse o presidente da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), Eduardo Sanovicz.
Ele próprio chegou a trocar por alguns dias o concreto de São Paulo pela vista do mar de um apartamento em Santos. "A virtualização permite isso."
(Getty Images)
Em novembro, o mercado brasileiro operou, na média, com o equivalente a 60% do número de voos de um ano antes, segundo a Abear.
Em cidades como Salvador, entretanto, o aeroporto local tinha a expectativa de fechar o mês com 81% de retomada da malha.
Outro indicativo de que o "anywhere office" está aquecido vem do crescimento na demanda dos provedores de acesso à nuvem, base para se viabilizar o trabalho remoto.
Alan Yukio Oka, responsável por Cloud Product and Marketing da BRLink, disse que as empresas acabaram acelerando a migração de cargas de trabalho para a nuvem na pandemia.
"Uma vez que os sistemas podem estar na nuvem e acessíveis de qualquer lugar do mundo, existe uma potencialização do conceito de anywhere office."
Silva e Giuliana, com a filha Victoria (Foto: Giuliana Pierri)
A preocupação com a filha Victoria, de oito anos, foi o que motivou Giuliana Pierri, 44, e seu marido, Sandro Gabrielli da Silva, 45, a buscar essa alternativa.
"Ficamos uns três meses completamente isolados e fazendo até supermercado pela internet. Em um determinado momento, comecei a pensar em alternativas", relatou ela.
Desde então, Pierri, que atua na área de marketing digital e produção de conteúdo, e Silva, diretor financeiro em uma empresa farmacêutica, já alugaram três casas em que os dois trabalharam remotamente.
A mais recente empreitada foi em resorts. "Meu marido tirou férias, mas continuei trabalhando normalmente", disse ela.
As instalações ofereceram atividades para as crianças e Victoria conseguiu fazer as provas escolares.
O presidente da Azul, John Rodgerson, no lançamento da Azul Conecta, no Aeroporto de Jundiaí
Apostando no aumento da demanda, a Azul Conecta, braço de aviação regional da Azul, anunciou nove destinos inéditos durante a temporada de verão, entre eles Ubatuba (SP), Paraty (RJ), Guarapari (ES) e Jericoacoara (CE).
Os voos decolam de áreas metropolitanas como Porto Alegre, Santos Dumont (RJ) e Congonhas (SP).
A própria empresa afirmou que os destinos - comuns em roteiros de férias - se mostraram interessantes para o home office.
Somadas, as rotas contarão com 38 voos diários.
A advogada Ana Carolina Monteiro, da área de reestruturação e insolvência do Kincaid, Mendes Vianna Advogados, atribui parte da recuperação da atividade de empresas do setor aéreo a essa migração dos escritórios.
"O turismo ligado ao anywhere office está proporcionando um impulso essencial para ajudar a sustentar muitos destinos turísticos e empresas na retomada da pandemia".
Destino de parte dos brasileiros que trocaram a residência pelo "anywhere office", os resorts passaram a oferecer serviços para que as crianças pudessem se divertir e estudar ao mesmo tempo, enquanto os pais se mantinham conectados no trabalho.
O Costão do Santinho, em Florianópolis (SC), teve a ideia de contratar pedagogos para dar reforço escolar.
Costão do Santinho, em Florianópolis (SC)
"Montamos uma sala de aula para as crianças e o espaço está sendo bastante usado, com pedagogos dando apoio", disse Rubens Regis, diretor comercial do resort.
"As crianças se sentam, fazem a aula e estão sempre acompanhadas, enquanto os pais aproveitam o espaço."
O Costão teve R$ 50 milhões em prejuízo entre março e novembro, ao deixar de promover 104 eventos.
O grupo se mexeu e investiu R$ 6,5 milhões em uma estrutura desmontável para eventos externos, que já tem procura para no ano que vem.
Na mesma direção, o Infinity Blue Resort & Spa, em Balneário Camboriú (SC), viu no "resort office" a oportunidade de alavancar a receita.
O estabelecimento ficou fechado entre os dias 25 de março e 1.º de julho.
"Estamos em um período de retomada no turismo", afirmou Juliana Campeoto, gerente comercial da empresa.
Infinity Blue Resort & Spa, em Balneário Camboriú (SC)
A empresa aproveitou a pandemia para fazer uma migração para o segmento de luxo.
Hoje, o resort opera com 53% da capacidade de antes, porcentual que será mantido diante da ampliação de alguns apartamentos, por exemplo.
"A demanda está boa. Para o Natal e fim do ano, a lotação está esgotada", disse.
Com informações do Estadão Conteúdo